O professor Arcilan Trevenzoli Assireu, do Instituto de Recursos Naturais (IRN), e os alunos Luiz Guilherme Prince Marcondes, Vinícius S. O. Carvalho e Werik Kaian Silva Rodrigues, da Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI), figuram entre os autores de um estudo publicado na revista Energy, intitulado Sea breeze-driven effects on wind down-ramps: Implications for wind farms along the north-east coast of Brazil – Efeitos provocados pela brisa marítima nas rampas de descida do vento: implicações para parques eólicos ao longo da costa nordeste do Brasil, disponível em https://authors.elsevier.com/c/1iiCY1H~c~PSw0.
O estudo elucidou a causa meteorológica raiz que culminou, recentemente, no extenso blackout ocorrido em agosto de 2023, quando o Brasil passou por um grande apagão, que estava ligado a um destes eventos de rampa. A explicação para este fenômeno meteorológico, oferecida no estudo realizado, é um passo crucial para o desenvolvimento de um modelo ideal de previsão de energia eólica.
A pesquisa teve como foco a compreensão de um fenômeno meteorológico relacionado a interrupções operacionais em uma usina eólica no litoral nordeste do Brasil. O estudo empregou observações meteorológicas aprimoradas com base em perfis de vento SODAR e LIDAR, torres micrometeorológicas, dados de reanálise ERA-5, dados de produção de energia eólica do Operador Nacional do Sistema Elétrico e imagens termais e visíveis do GOES-16.
Segundo os autores do artigo, espera-se que a realização da pesquisa possa fornecer uma visão valiosa sobre as complexas interações entre fenômenos meteorológicos locais e a produção de energia eólica na costa nordeste do Brasil e que sua aplicação tenha o potencial de melhorar a previsão operacional de usinas eólicas.
Detalhes do estudo
Em 15 de agosto de 2023, o Brasil passou por um apagão generalizado, causado em grande parte por eventos de diminuição intensa e súbita no vento, conhecido como efeito rampa, que afetaram vários parques eólicos ao mesmo tempo. Os fatores que levaram ao fenômeno foram categorizados em três categorias dependentes: uma queda acentuada na temperatura do ponto de orvalho, a presença de nuvens tipo cúmulo logo acima da linha costeira no início da manhã e/ou chuvas sobre o mar adjacente, proporcionando a viabilidade da previsão destas rampas de vento.
No estudo realizado, os resultados derivados do modelo conceitual sugerem que a brisa marítima desempenha um papel significativo no vento resultante na altura do centro da turbina e, muitas vezes, excede a influência do fluxo em grande escala. Considera-se que o vento resultante é causado pela interação entre ventos alísios e brisas intensas.
O estudo investigou os processos físicos, juntamente com as condições de meso e grande escala relacionadas a um evento meteorológico associado a descidas do campo eólico que resultou na interrupção operacional ou queda dramática na geração de eletricidade em uma grande usina eólica instalada no Nordeste do Brasil.
A detecção precoce deste evento permitiria notificar operadores do sistema elétrico sobre sua ocorrência com antecedência, favorecendo ações de gerenciamento do sistema, como fornecer assistência para melhorar estratégias de controle preventivo/corretivo em sistema elétrico com alta penetração de energia eólica, o que é o caso do sistema no Nordeste brasileiro.
Segundo os pesquisadores, o sinal mais evidente deste evento, chamado no estudo de Vento Sul – termo usado pelos criadores de cabras locais –, é uma queda repentina na velocidade do vento e uma mudança brusca na direção do vento de Nordeste (vento marinho) para Leste-Sudeste (vento continental), ao contrário do que se espera para o época correspondente na estação seca.
No estudo foi observado que: houve queda (aumento) média de temperatura (umidade) de 1,5 ± 0,5 ◦C (10 ± 3%), que a depressão do ponto de orvalho apresentou valores menores durante o evento e que a frequência de ocorrência do Vento Sul é mais que o dobro das estimativas para novembro (frequência máxima) do que para setembro (frequência mínima) durante os meses da estação seca.
O estudo revelou que a perda financeira correspondente variou de 0,1 milhão de dólares (setembro de 2021) a 1,1 milhão de dólares (novembro de 2022) com uma perda total de US$ 3,7 milhões para o período de dois anos analisado (setembro de 2021 a novembro de 2022).
No que diz respeito à brisa marítima, os resultados confirmam os achados anteriores de que a dinâmica do fluxo local é controlada pelo fluxo em grande escala e pelo contraste térmico da superfície terra-oceano. Uma descoberta interessante foi que, devido ao acoplamento do fluxo em grande escala com a circulação térmica de mesoescala, o vento resultante na altura do núcleo dos aerogeradores é um vetor resultante entre o fluxo nestes diferentes níveis.
O estudo também observa que o Nordeste do Brasil possui alguns dos parques eólicos mais eficientes do mundo, como resultado da interação entre ventos alísios e brisas consistentes na região e não apenas aos ventos alísios, como é amplamente divulgado.
Uma consequência deste estudo para energia eólica offshore, planeadas ao longo da plataforma continental nordeste brasileira, é que a extensão horizontal da brisa marítima em direção ao mar será de importância crucial quando da procura dos locais mais adequados para a instalação de um parque eólico offshore.
A importância da brisa marítima para os recursos eólicos indica que, resultados como os encontrados na baía do Médio Atlântico dos EUA, que indica velocidades do vento três vezes maiores sobre a plataforma aberta do que ao longo da costa, dependerá, para a área de estudo, da extensão da brisa marítima em direção ao mar. A evolução temporal das brisas foi impulsionada pela diferença no ciclo de temperatura da superfície mar-terra.
Durante o período de convecção foram observadas velocidades verticais de até 1,0 ms− 1 que, somadas às extensas ilhas de calor das dunas, fazem com que a região seja caracterizada por linhas de nuvens cúmulos durante o início da manhã. Quando essas nuvens estão na posição correta para bloquear o sol, o início da brisa marítima ocorre mais tarde do que aconteceria se as linhas de nuvens não estivessem presentes.
Como resultado, o vento resultante na altura dos aerogeradores experimentará uma rotação no sentido horário e mudará de nordeste (vento marinho) para leste-sudeste (vento continental), com consequências dramáticas para os parques eólicos locais. Estes resultados podem ser estendidos a outras regiões do mundo onde o sinal de um vento sinóptico supera os sinais de uma brisa marítima e a convecção é suficientemente intensa para interagir o fluxo em grande escala com as circulações térmicas de mesoescala.
O estudo sugere que, em trabalhos futuros, valeria a pena investigar se a convergência gerada pela interação entre a brisa marítima e a brisa de um rio costeiro da região é um fator que contribui para a formação das linhas de nuvens cúmulos, conforme sugerido pelos resultados encontrados no estudo.
Demais autores
Também são citados como autores do artigo publicado os seguintes professores e pesquisadores de outras instituições: Gilberto Fisch, do Departamento de Ciências Agrárias, da Universidade de Taubaté (UNITAU); Felipe M. Pimenta, do Centro de Ciências Físicas e Matemáticas, do Programa de Pós-Graduação em Oceanografia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); Ramon M. de Freitas, da Camargo Schubert Engenharia Eólica, de Curitiba - PR; Osvaldo R. Saavedra, Audálio R. T. Júnior, Denisson Q. Oliveira, Denivaldo C. P. Lopes e Shigeaki L. de Lima, do Instituto de Energia Elétrica da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), e Francisco L. A. Neto, do Laboratório de Meteorologia Aplicada da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Apoios
O estudo foi apoiado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) no âmbito do projeto de P&D (PD-00037–0042/2020), financiado pela Gera Maranhão S.A. e Equatorial Energia S.A. e coordenado pelo Instituto de Energia Elétrica da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).
Para sua realização, os autores contaram ainda com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Desenvolvimento Tecnológico do Brasil (CNPq), da Fundação de Amparo à Pesquisa e Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Energias Oceânicas e Fluviais (INEOF).
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